Manual de Instruções

Caros leitores, após muito tempo decidi quebrar alguns de meus votos de silêncio. Um deles inclui voltar a escrever por aqui. O outro, falar de política. Tarja Preta versão 3.0, divirtam-se!
Caso você encontre em algum dos meus textos algo interessante e queira compartilhar com seus amigos ou em seu site, revista, jornal, etc., sinta-se à vontade. Basta indicar a fonte e recomendar a leitura do blog, e todos os textos que estão aqui estarão ao seu dispor.

P. S.: decifra-me ou devoro-te!

quarta-feira, 21 de maio de 2008

O Um Anel

Três Anéis para os Reis-Elfos sob este céu,
Sete para os Senhores-Anões em seus rochosos corredores,
Nove para Homens Mortais, fadados ao eterno sono,
Um para o Senhor do Escuro em seu escuro trono
Na Terra de Mordor onde as Sombras se deitam.
Um Anel para a todos governar, Um Anel para encontrá-los,
Um Anel para a todos trazer e na escuridão aprisioná-los
Na Terra de Mordor onde as Sombras se deitam.

domingo, 18 de maio de 2008

3. Questão do Homem e do Ser Humano

Minha presente reflexão deve ser tal que, por si só, justifique todo o método de análise empregado nas minhas futuras reflexões. Com efeito, não posso ignorar um fato gritante em meus estudos, fato esse que certamente vale uma reflexão — e não qualquer reflexão, mas a primeira e fundamental, sobre a qual tentarei erguer todo o edifício de minhas idéias —, uma análise e um estudo o mais aprofundado quanto minhas capacidades me permitirem: não há a compreensão de nenhum fenômeno — e sequer eles podem ser dar a desvelar a um observador — que não seja pela via da consciência. Não falo de consciência como o cristianismo, mas falo de um outro tipo de consciência, mais elevada, limpa, pura, perfeita: o humanitas, o ser-além-humano.

Vamos começar esta análise pelo mais básico e fundamental; de fato, antes da consciência, devemos comentar um pouco nos efeitos que a falta dela provoca na humanidade. Antes de tudo, devemos procurar entender o que é a humanidade, e como se deve entender a palavra consciência no contexto deste escrito. Não pense que, com humanidade, eu estou falando da espécie humana como um todo, isto é, da criatura biológica, do animal Homo sapiens sapiens que rasteja pela superfície deste planeta há pelo menos dez mil anos. Não, não — seria um conceito muito pobre de "humanidade" para se ter... Eu raramente falo em termos corporais — eu quero apenas as melhores coisas, e o físico, o visível, é uma mera sombra do que há realmente de melhor (como diria Platão). Mas, então, o que seria "humanidade"? Se eu não falo do corporal, do físico, então o que ela seria para mim?

Essa questão é um pouco complicada para se por em palavras, embora ela tenha uma resposta muito simples. Ao desconsiderar a definição biológica do termo, eu recorro a uma das definições filosóficas de "humanidade" — "humanidade" como sendo um atributo mental. Em poucas palavras (e, como é comum a estas, insuficientes), a "humanidade" é aquilo que faz do homem ser humano. Mas, como eu disse anteriormente, poucas palavras são insuficientes para esta definição — é preciso saber agora o que é ser humano. Chamo à atenção o fato que não uso a expressão ser humano com o mesmo sentido que o vulgo usa — para este, a expressão é um mero sinônimo de "homem"; para mim, significa algo muito maior... Lembremos que a opinião do vulgo sobre o significado das palavras deve-se ao seu natural desconhecimento das coisas e como estas se dão a conhecer. Cego e desorientado pelas trevas em que vive, o vulgo nada mais faz que não seja prender-se às falsas aparências...

Pense comigo: quando falamos que uma pessoa é um médico, por exemplo, associamos a ela todos os atributos que se relacionam a um médico (a saber: conhecimento das doenças, do corpo do homem, e tantos outros atributos). Assim, podemos falar que ser médico é ser associado com todas essas características relacionadas a um médico, e que ser médico não é um nome (isto é, um agente ou uma coisa da qual se fala), mas um predicado (isto é, uma característica ou uma ação feita por um coisa) — associa-se um nome (geralmente uma pessoa) ao predicado ser médico, como, por exemplo, "Fulano é médico" — que se associa a nomes. Transportando o raciocínio ao ser humano, temos que não se trata de um nome composto (isto é, mais de uma palavra que pode fazer a função de um nome), mas de um predicadoser humano). que precisa de um nome para lhe conferir significação (isto é, para dizer quem desempenha a ação de

Mas, se ser humano é um predicado, e um predicado dá uma característica ou uma ação feita por alguma coisa, é lícito perguntar a que característica ou que ação ser humano se refere. Voltemos ao exemplo do médico. Quando nos referimos ao predicado ser médico, estamos nos referindo a uma ação desempenhada por um nome (o nome ao qual será relacionado o predicado ser médico) e a uma série de características associadas ao nome médico por outros predicados (ser conhecedor das doenças, ser conhecedor do corpo, etc.) e, que por meio do predicado ser médico, são associadas a outros nomes. Pois bem, de maneira análoga infere-se que o predicado ser humanohumano — pois, quando dizemos "Fulano é humano", associamos todas as características do nome humano (que foram associadas a este por outros predicados) ao nome Fulano, não importando quais sejam as características associadas ao nome humano. associa a um nome as características associadas ao nome

Parece que com isso chegamos a um dos pontos centrais da questão — que predicados são associados ao nome humano? Ou, que atributoshumano? Devemos, antes de qualquer coisa, distinguir claramente a que coisa queremos nos referir quando empregamos o nome humano — e tenha certeza que não chegaremos à mesma conclusão do vulgo aqui! Poderemos mais uma vez recorrer a poucas palavras e afirmar — humano é aquilo que está acima e além do homem —, mas ficaríamos na mesma — o problema, que era um, tornou-se dois, a saber: a que coisa se refere o nome homem, e de que maneira a coisa a que se refere o nome humano está acima e além daquela coisa a que se refere o nome homem. Mas, creia-me ainda que precisaremos escavar mais ainda nesta problemática, e temo que, realmente, devamos ficar com as poucas palavras e aceitar a divisão do problema. A outra hipótese — supor o significado do nome homem e a partir daí continuar a análise — não será usada devido ao desejo de rigor, necessário a quem se propõe a refletir. Tomarei então as duas questões levantadas como sendo fundamentais para a análise que procedo — a saber, a que coisa se refere o nome homem e de que maneira a coisa a que se refere o nome humano está acima e além da coisa a que se refere o nome homem. podemos associar ao nome

A que coisa se refere o nome homem é uma das poucas respostas para as quais umas poucas palavras bastam bem. Homem, ou criatura-homem, é o animal, o ser físico-biológico ao qual os cientistas chamam de Homo sapiens sapiens. Portanto, o nome homem se refere à criatura bípede, potencialmente onívora, capaz de locomoção, respiração, reprodução... e todos os outros atributos que se podem associar a esse animal — basta olhar de si para si com olhos críticos e aqueles serão encontrados. Percebam que a capacidade da linguagem e o pensamento (ou melhor, os predicados ser capaz da linguagem e ser pensante) devem ser deixadas de fora nesse estágio — elas não são características puramente animais para se enquadrarem no nome homem, e sim prenúncios do que está por vir ainda. O nome homem designa pura e simplesmente o ser animal, que satisfaz apenas suas necessidades animais e todas as outras complementares a estas. Aliás, o predicado ser animal é predicado do nome homem — o que implica no caráter pré-pensamento e pré-linguagem em que a coisa a que se refere o nome homem está.

Precisamente, o nome homem, por estar associado ao predicado ser animal, tem todas as características desse predicado e — por estarmos definindo a coisa a que o nome homem se refere como sendo o animal físico-biológico — e nenhuma característica a mais vinda de outros predicados — isso é bem intuitivo, mas ainda assim a podemos explicar. A definição da coisa a que o nome homem se refere restringe-se a duas palavras apenas: "animal" e "físico-biológico". Descartemos a última, por ser um adjetivo da primeira — e adjetivos só dizem das palavras às quais se ligam um dos modos como estas aparecem —, e ficamos com um único nome — o nome animal. Assim, pela definição, apenas as características do nome animal podem ser associadas ao nome homem, e nenhuma característica que não seja associada ao nome animal pode ser associada ao nome homem — pois, de fato, apenas o nome animal se liga ao nome homem por meio do predicado ser animal.

Cumprida a tarefa de definir a que coisa se refere o nome homem, podemos então passar para a próxima questão — como a coisa a que se refere o nome humano está acima e além da coisa a que se refere o nome homem. Recapitulemos aqui que a coisa a que se refere o nome homem não passa de mais um animal entre tantos, indistingüível dos outros a não ser pelo seu nome e pelos seus predicados, e que excluímos os predicados ser capaz da linguagem e ser pensante da lista dos predicados associados ao nome homem — pois de fato, o nome homem não os têm. Agora cabe a pergunta: por que separamos esses dois predicados dos demais? Por que esses predicados não são predicados associados ao predicado ser animal, e, por isso, não podem ser associados ao nome homem, conforme demonstramos anteriormente. Mas isso ainda não responde a questão proposta.

O nome homem se refere a uma coisa com predicados específicos e que lhe são próprios. Por meio desses predicados, a coisa a que se refere o nome homem se torna distinta de todas as outras coisas que não são sinalizadas pelo nome homem. Agora, se associarmos predicados ao nome homem, deixaremos de nos referir à coisa sinalizada pelo nome homem, mas estaremos nos referindo a uma coisa completamente distinta — estaremos obtendo uma coisa além daquela a que se refere o nome homem, pois essa nova coisa nada mais é do que a coisa a que se refere o nome homem acrescida de novos predicados. Mas isso, por si, não responde a questão, ainda.

E se a coisa gerada pela adição de novos predicados à coisa a que se refere o nome homem for, em alguma instância — não devemos entrar ainda na questão sobre que instância —, melhor — não importando que características contenha esse predicado — do que a coisa original, é lícito afirmar que a coisa gerada é melhor do que a coisa geradora. Sendo lícita tal afirmação, poderemos ainda afirmar — a coisa gerada é mais melhor do que a coisa geradora — se com isso se desejar dizer que ambas as coisas podem ser predicadas com o predicado melhor, mas uma delas em maior grau do que a outra — uma comparação simples, como aquelas que até as crianças entendem. Ao afirmar — a coisa gerada é mais melhor do que a coisa geradora —, pode-se licitamente afirmar — a coisa gerada participa do predicado melhor pelo menos em um grau acima do da coisa geradora.

Atenção — em momento algum eu disse que características o predicado melhor transmite aos nomes com os quais se relaciona! Isso é importante, pois mostra que essa derivação é válida para quaisquer características que venham a ser transmitidas pelo predicado melhormelhor transmite aos nomes com os quais ele se relaciona — pois o fato de uma coisa estar um grau acima da outra se deve à relação que elas mantém entre si e com o predicado melhor, e não ao significado deste. Melhor pode ser inclusive um predicado vazio (isto é, um predicado que não transmite nenhuma característica aos nomes com os quais se relaciona), que o afirmado anteriormente ainda se verificará. aos nomes com os quais ele se relacionar. Não importa, em hipótese nenhuma, que características o predicado

A questão agora é identificar qual dos dois nomes — homem ou humanomelhor. É claro que temos interesse que tal identificação seja feita desconsiderando toda e qualquer característica do predicado ser melhor, pois assim garante-se a universalidade da análise — os particulares não interessam aos grandes de espírito. E, para tanto, dependeremos da relação que os nomes homem e humano guardam não apenas com o predicado ser melhor, mas também com o predicado ser superior — que intuitivamente perceberemos, caso estejamos realizando este pequeno estudo com a devida seriedade, é um predicado equivalente ao predicado estático, ou o predicado de estado, estar acima — e, portanto, desvendar como os nomes homem e humano se relacionam com o predicado ser melhor é desvendar como esses nomes se relacionam com o predicado estático estar acima. — participa em maior grau do predicado

Quero, neste ponto, incluir um pequeno comentário acerca dos dois tipos de predicados com os quais estaremos lidando a partir deste ponto de nosso estudo. Podemos facilmente perceber que já na estrutura formal esses dois tipos se diferenciam: um deles se constrói em torno do verbo ser, e o outro, em torno do verbo estar. Mesmo lingüisticamente falando existe uma sensível diferença entre o significado principal desses verbos, como, aliás, todos nós sabemos: o verbo ser é usado para expressar identidades (chama-se aqui identidade toda e qualquer oração que possua a estrutura formal S é P, identificando todos os instantes de um sujeito, ou nome, S a um predicado P), enquanto o verbo estar é usado para expressar estados (chama-se aqui estado toda e qualquer oração que possua a estrutura formal S está P, associando um predicado P a um instante do sujeito, ou nome, S). O verbo ser, portanto, identifica um predicado a um sujeito, ou diz que determinado sujeito S tem em si o predicado P. Já o verbo estar não traça essa identidade, mas compara um determinado aparecer do sujeito S ao predicado P. Chamemos os predicados que possuem a forma ser P de predicados identificadores (ou de identidade), e os predicados que possuem a forma estar P de predicados estáticos (ou de estado).

Postas essas considerações, podemos aprofundar nosso nível de investigação. Se estar acima é um predicado estático, podemos inferir facilmente — mas com o mais profundo equívoco que o céu e a terra jamais viram — que os dois nomes, homem e humano, participam ora em mais grau desse predicado, ora em menos. Isso significaria dizer que poderemos ter ora o nome homem participando mais do predicado estar acima que o nome humano, ora o inverso. Mas neste caso em questão não estamos habilitados a fazer essa simples redução, pois não ainda refletimos sobre a equivalência entre o predicado estático estar acima e o predicado identificador ser superior.

Devemos detalhar um pouco essa equivalência. É imediatamente óbvio que o predicado estar acima associando um instante do predicado ser superior a um nome, enquanto o predicado ser superior associa todos os seus instantes ao nome com o qual se relaciona. Intuitivamente se chega a uma espécie de escalonamento entre esses dois predicados da ordem de abrangência, ou, em outras palavras, o predicado ser superior é mais abrangente que o predicado estar acima. E todo o diferencial deste ponto do estudo é essa questão da abrangência. Pois, se há uma equivalência entre esses dois predicados, ela não se processa no campo da abrangência e, por conseguinte, nenhuma redução como a exposta acima poderia funcionar.

Tal equivalência se perde também no domínio do tempo, pois enquanto o predicado estático estar acima se refere a um determinado instante do nome, o predicado identificador ser superior se refere a todos os instantes do nome. Se voltarmos à definição de predicado estático e predicado identificador, perceberemos que o exposto acima é tão intuitivo que sequer precisaria ser dito, mas, por mero critério de clareza, retomo aqui esse ponto. Quando se diz que um predicado estático associa um predicado a um determinado instante de um sujeito, significa dizer que para aquele instante no qual se faz a predicação o predicado está associado ao sujeito. Não há nenhum compromisso com nenhum instante que não seja o dado instante no qual se faz a predicação. Já o predicado identificador associa o predicado a um sujeito de tal forma que a predicação é válida para todos os instantes válidos para uma predicação.

Percebemos, então, que a equivalência não se processa no domínio da abrangência, tampouco no do tempo. Mas, afinal, de qual forma se dá essa equivalência? Se nos lembramos bem de nossas primeiras reflexões neste texto, os predicados associam características aos nomes. Pois bem, se a equivalência não se processa no domínio do tempo nem no domínio da abrangência, resta a essa equivalência processar-se no domínio dos conteúdos dos predicados. E então chegamos a um ponto que, intuitivamente, percebe-se a equivalência entre eles realiza-se justamente nesse domínio. Mas é igualmente intuitiva a percepção de que a equivalência entre esses predicados realiza-se apenas nesse domínio e em nenhum dos outros dois domínios analisados aqui. Portanto, concluímos que a equivalência entre esses predicados se limita ao conteúdo dos mesmos.

Posto isso podemos continuar a análise a que nos propomos antes dessas definições, a saber, como os predicados ser homem e ser humano se relacionam com o predicado ser superior. Concluímos antes que a coisa gerada participa do predicado ser melhor em pelo menos um grau acima da geradora, e também concluímos que o predicado ser homem pode gerar um predicado que esteja além dele e, portanto, participa em pelo menos um grau acima do predicado ser melhor. A questão que se segue, depois dessas considerações, é saber se é possível gerar algum predicado novo a partir do predicado ser homem.

Lembremos que existem dois predicados que não parecem estar relacionados com o predicado ser homem: os predicados ser capaz de linguagem e ser pensante. Conforme exposto anteriormente, o predicado ser homem é gerado imediatamente do predicado ser animal e parece, por esse mesmo motivo, estar no mesmo patamar de predicados como ser porco, ser peixe ou outros predicados dessa linha. Como é empiricamente factual que aos nomes relacionados a esses predicados não se associam os predicados ser capaz de linguagem e ser pensante forçosamente se conclui que esses predicados não podem ser associados a outros predicados que estejam neste nível ainda.

Nada, porém, impede que esses dois predicados possam ser associados a outros, gerando assim predicados que estejam além, e participem em pelo menos um grau a mais do predicado ser melhor, dos predicados originais. Em outras palavras, é possível gerarmos a partir de um predicado qualquer um outro que participaria em pelo menos um grau a mais do predicado ser melhor e esteja além do predicado original acrescentando a este os predicados ser capaz de linguagem e ser pensante. Percebamos que esses predicados poderiam ser associados a qualquer outro predicado pré-existente — mas por algum mero acaso esses predicados foram associados ao predicado ser homem, gerando assim um predicado além e pelo menos em um grau melhor do que ser homem.

Pensemos agora: como poderíamos caracterizar precisamente o predicado ser humano? Mais precisamente, o que diferencia esse predicado dos demais? Pensemos, e fatalmente chegaremos à mesma conclusão que outros pensadores antes de mim já chegaram: são justamente os predicados ser capaz de linguagem e ser pensante. Para quem quiser se certificar disso basta que leia com atenção clássicos como Aristóteles, Descartes e outros dessa linha. Portanto o predicado ser humano é gerado a partir do predicado ser homem, ao se acrescentar a este os predicados ser capaz de linguagem e ser pensante. Pelo que já demonstrei anteriormente, é forçoso que o predicado ser humano esteja além do predicado ser homem e que participe aquele do predicado ser melhor em pelo menos um grau a mais do que este, e portanto tem-se demonstrado o significado do predicado ser humano, conforme se queria demonstrar.

terça-feira, 13 de maio de 2008

Pequenas Considerações sobre a Nossa Educação e sobre as Políticas de "Formação" de Professores na Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Caríssimos amigos e existentes leitores deste pequeno pedacinho de chão em um céu virtual escondido debaixo do mosquitinho preto rajado de branco pousado entre as dobras do tecido acolchoado plasmado na imanência das paredes transcendentes de um quarto estabelecido na linguagem daqueles que acreditam na chamada realidade consensual e a ela dão suporte como "apartamento em clínica de repouso" - mas pelo seu morador permanente chamada simplesmente de "casa". Dia desses seu cronista virtual realmente insano vestiu sua melhor camisa de força e decidiu dar umas voltas pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro para assistir algumas aulas na Faculdade de Pedagogia - ele é ainda aluno daquela bodega, e por isso tem que sujeitar a essas coisas. Pois bem, vamos ao que interessa: o nível das coisas me assustaram.
Em primeiro lugar parece que a ex-vice-diretora da referida Faculdade tem dificuldades em concatenar três ou mais palavras de maneira coerente ou dotada de alguma significação. Para não demonstrar isso na frente dos alunos ela simplesmente concorda com qualquer coisa que for dita - ou seja, é bem provável que se eu falar que Kant propôs um modelo de educação epicurista ela acredite e repita para quem quiser ouvir. Mas isso não é o pavoroso, pois algumas pessoas têm mesmo essa dificuldade de se expressar na frente das pessoas (mas eu ainda penso que pessoas assim não deveriam se tornar professores, mas deixa pra lá...), e por isso mesmo não vamos exigir tanta desenvoltura dela. O pavoroso mesmo são os textos escritos por ela, pois parecem obedecer a uma norma própria de gramática, sintaxe, coerência e pontuação. Como um camarada de suplício disse, "o texto não junta 'lé' com 'cré'".
Em segundo lugar o nível geral dos alunos, tanto da Pedagogia em si quanto das outras Licenciaturas, está, salvo cada vez mais raras exceções, baixíssimo. A maior prova disso é que pensamentos mais complexos do que os chavões novelísticos são para essa maioria incompreensíveis - e isso afirmo por observar que esses alunos não conseguem entender as besteiras que a ex-vice-diretora fala na frente da turma. Mas os piores dentre esses são realmente os alunos da Pedagogia, que acreditam piamente estarem produzindo algum conteúdo científico sobre pessoas e escrevendo artigos com complexidade e profundidade - mas na verdade estão tentando enfiar pessoas em categorias fixas e proferindo discursos vazios, incoerentes e desprovidos de significado. É claro que existem as exceções (graças ao bom Deus que existam!), mas no geral o quadro é essa tragédia.
Em terceiro lugar temos a incoerência e a absoluta falta de significado das proposições dos textos produzidos pela e para a Pedagogia e Licenciaturas. Tudo bem que se deseje produzir discursos vazios sustentados por uma retórica bela e construída de tal maneira a adquirir uma verossimilhança, uma aparência de verdade que justifique a existência daquele discurso vazio - mas nem isso esses textos conseguem. Inclusive parecem discurso de psicólogo: giram, giram, giram e acabam voltando ao ponto em que começaram sem ter ido a lugar nenhum - o popular "correr atrás do próprio rabo". E são esses materiais sem conteúdo e sem beleza que são usados como material base para a formação de professores na referida Universidade.
Mas por que estou comentando isso? O motivo é muito simples, caros leitores desta Acta Diurna. Estou extremamente preocupado com o péssimo nível médio dos professores que estão sendo formados pela citada instituição. Se uma das propostas da Universidade é formar profissionais capazes de assimilar novas tecnologias e metodologias, pessoas com ampla capacidade de reflexão e pensamento e (no caso da Formação de Professores) educadores capazes de incitar nos seus alunos o amor ao conhecimento e o desejo de se aprofundar nele, mas temos esse estado de coisas calamitoso, o que será de nossas crianças? O caos é maior justamente entre os alunos das séries iniciais (atuais 1ª à 5ª séries, antigo Ensino Primário), pois os profissionais formados pela Faculdade de Pedagogia da Universidade citada mal conseguem compreender um período que possua mais de duas orações - como eles vão ensinar isso aos seus alunos? E lembremos que o antigo Primário é a base para todo o processo educativo - onde iremos parar assim?
Caros leitores, vocês sabem que eu não sou de propor soluções para os problemas que observo no mundo - antes prefiro que eles existam, pois preciso de coisas para me distrair do rigoroso exercício do pensamento insano -, mas não é possível deixar quieto um assunto desses. Não estou me apegando ao lugar-comum que diz que a educação é a chave para o futuro do país - que se exploda o país, sinceramente -, mas não posso negar que a Educação (isso mesmo, com "E" para refletir justamente o que ela deveria ser: amor ao conhecimento) é importante. O conhecimento liberta o Homem de seus grilhões, e apenas quem conhece pode fazer suas escolhas com propriedade - e é papel da Educação prover o Homem de conhecimentos. Mas como esperar que o Homem realize todo o seu potencial se ele está privado da Educação? Como esperar que o Homem realize o seu vir-a-ser, como esperar que o Homem se torne aquilo que é, como esperar que o Homem ascenda à Verdade, ao Belo e ao Bem se no lugar da Educação lhe oferecem uma educação chinfrinha e mediocricidante? Como esperar que o homem se torne Homem se os avatares dessa transformação - os Educadores - sofrem esses mesmos processos de despotencialização - ou seja, não recebem Educação mas sim educação - e por isso mesmo não podem transmitir essa Educação aos seus alunos?
Estamos em um estado de coisas pavoroso, repito, e, acrescento, o motivo desse meu desespero é justamente que os agentes da maior das transcendências - o homem tornar-se Homem e depois tornar-se Übermensch, ou seja, algo além do Homem - estão sendo vítimas desse mesmo processo. O que esperar da Educação no Brasil dado essa situação? - nada de bom, eu respondo. Esse tipo de processo tende a ser no melhor do estilo "bola de neve": educadores medíocres formam alunos medíocres que ingressam em um curso de formação de professores composto por profissionais medíocres e se tornarão professores mais medíocres ainda - e o ciclo recomeça. As poucas vozes capazes ou sensatas são silenciadas pelo sistema, de modo que tudo permaneça tão "bem" quanto já está - ou "melhor".
Que país é esse que estamos projetando?

sábado, 10 de maio de 2008

2. Questão de Deus

Logicamente é impossível negar a existência de Deus, pelo menos no sentido de princípio primeiro. Qualquer sistema que proponha que algo subsiste indenpendentemente de qualquer outro algo apenas está dando um outro nome ao princípio primeiro. Qualquer sistema que proponha que não existe algo que subsiste independentemente de qualquer outro algo impossibilita o conhecimento verdadeiro de tudo que exista no mundo. Sem a possibilidade de conhecimento verdadeiro, o que se tem é a multiplicação das opiniões pessoais, o que impossibilitaria a comunicação e a transmissão de idéias. Se algo subsiste independente dos fatos do mundo, esse algo é o princípio originário dos fatos.
Os princípios não podem todos possuir um princípio, pois a regressão ao infinito neste caso é o mesmo que afirmar que não há um algo que subsista independentemente de qualquer outro algo. Tem que existir um princípio primeiro, e o nome dele não importa - seja teoria quântica ou o Místico. Da subsistência do princípio primeiro do mundo infere-se a existência dos demais princípios do mundo, mas o caminho inverso é inseguro de ser trilhado. Os princípios são inferidos do mundo, dos fatos, dos objetos, mas o caminho inverso não pode ser trilhado com segurança. A conexão entre o mundo, os fatos, os objetos e os princípios é de natureza lógica. Nem sempre a equivalência é um princípio aplicável à lógica, mas a lógica é um princípio aplicável à equivalência.
Não se pode sustentar a existência de uma relação direta entre Deus e uma religião, qualquer que seja a religião. A existência de Deus não é necessária de outra forma que não seja princípio primeiro. Só é necessário que Deus subsista no mundo. Qualquer outra manifestação de um princípio não será a manifestação do princípio primeiro. Mesmo que o princípio primeiro pudesse ser explicado pela teologia, ele seria tão obscuro quanto os motivos que causaram o Big Bang no universo primordial, senão mais. Qualquer relação entre uma religião e um princípio primeiro só pode ser percebida dentro da ordem do sensível, o que invalida qualquer tentativa de comprovação de sua existência. Daquilo que não se pode conhecer não se pode falar mais do que uma simples e desvalorada opinião, mas daquilo que se conhece deve-se falar tão claramente quanto se conhece e se deseja falar.

1. Questão do Mundo

Existe um mundo tal como nossos olhos percebem uma série de coisas? Dados sensíveis tem o péssimo hábito de estar além de qualquer possibilidade de verificação que não seja a comparação com sua fonte. Por isso eles não servem para me dizer o que é o mundo, ou o que existe no mundo. Se os sentidos servissem para dizer o que o mundo é, teríamos uma infinidade de mundos que não se comunicariam entre si. Se os sentidos não alcançam dizer o que é o mundo, essa resposta se encontra além dos limites do sensível - ela deve estar na razão, na lógica. O mundo só pode ser descrito nos termos da razão, da lógica - qualquer outra fonte de dados não servirá para esse propósito. Os dados sensoriais não alcançam falar dos fatos do mundo. Se os fatos do mundo pudessem ser descritos em termos sensoriais, um mesmo fato geraria um infinito número de descrições parcialmente incompatíveis entre si, o que tornaria inútil a linguagem. Os fatos do mundo possuem a mesma natureza do mundo quanto a descrição, senão não poderiam ser descritos. Se os fatos do mundo não podem ser descritos em termos sensíveis, apenas o que está além do sensível pode descrever o mundo - a razão, a lógica. Os dados sensíveis são particulares, a razão é universal.
Os dados sensíveis não alcançam descrever os objetos do mundo. Se os objetos do mundo fossem descritos em termos sensoriais, haveriam tantas descrições dos objetos que inutilizariam qualquer tipo de conhecimento sobre o objeto. Os obejtos do mundo possuem a mesma natureza do mundo, senão não poderiam aparecer no mundo. Se os dados sensíveis não conseguem descrever os objetos do mundo, a descrição só é possível com elementos que estejam além dos sentidos - a lógica, a razão. A instância última dos sentidos é a instância primeira da razão e da lógica.
O mundo, os fatos e os objetos só podem ser descritos - e portanto conhecidos - nas instâncias da razão e da lógica apenas. O mundo, os fatos e os objetos se resolvem em fatos da razão e da lógica. Só existe uma maneira de conhecer o mundo, uma maneira de descrevê-lo. Essa maneira é a maneira lógica. A multiplicidade de existências que as descrições baseadas nos dados sensíveis sugere é ilusória, pois só pode haver uma descrição completa, uma maneira de conhecer o mundo. É enganoso pensar que mais de uma descrição completa é possível do mesmo mundo, do mesmo fato, do mesmo objeto. Descrições diferentes só podem ser diferentes se não forem descrições completas. O mundo, os fatos, os objetos se dão a conhecer completamente em caracteres lógicos, e se permitem descrever completamente em caracteres lógicos.

Série Questões

Caríssimos amigos e existentes leitores desta tasquinha de pergaminho pendurada nas asas do mosquitinho preto rajado de branco pousado em uma das dobras da costura no acolchoado velho conhecido e amado por todos vocês instalado no lado de dentro do cantinho de reflexões que muitos chamam de cela no manicômio por eles chamado de "realidade consensual" - mas que seu ocupante chama de "lar". Neste momento eu estava olhando um antigo projeto meu, já desativado, mantido em outro blog: a Série Questões. Nessa série eu discorria sobre um determinado assunto de maneira não a esgotá-lo ou a clareá-lo, mas para expor o que minha mente completamente maluca, insana e fragmentada pensa sobre aquele assunto. Pois bem, eu estou reativando o projeto Série Questões, desta vez disposto a dar continuidade às minhas primeiras reflexões que se arvoraram falar de coisas necessárias sem que elas em si fossem necessárias. Divirtam-se!

P. S.: em breve eu pretendo organizar o tão amado serviço de desinformação virtual que todos vocês amam, separando o que é poesia, o que é reflexão e o que é besteira mesmo. Em breve.

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Irina Palm

Caríssimos amigos e existentes leitores deste pequenino espaço intervirtual dedicado a examinar aquele mosquitinho preto rajado de branco que está ali pousado entre as costuras do acolchoado desta já conhecida e amada por todos cela em algum manicômio escondido ou perdido em algum canto de um lugar chamado por todos menos o seu interno de "realidade consensual". Dia desses seu cronista insano decidiu vestir a sua melhor camisa de força e visitar um cinema para ver algum filme interessante. Orientado e acompanhado por Cristina, ele acabou indo ver um filme muito elogiado pela crítica (e que portanto tinha tudo para não prestar) chamado Irina Palm - este link direciona ao comentário que eu fiz em Cocômentários, um blog de resenha de livros, filmes, animes, receita de bolo, bula de remédio - o que aparecer pela frente. Como eu não sou fã de fazer a mesma coisa duas vezes, recomendo que quem quiser conhecer mais sobre o filme que leia em Cocômentários a resenha que eu fiz - mas garanto que vocês não vão se arrepender.

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Os Dez Dogmas de Pai Preguiça, baseados na oração que o Pai ditou ao Seu servo

Pai Preguiça que estás na rede
1º Dogma: Nosso Pai e Criador é Pai Preguiça, que repousa em sua Divina Rede bebendo água de coco e apreciando Sua obra.

Santificado seja o vosso sono
2º Dogma: O Sono é o Legado de Pai Preguiça para Seus filhos, e Santo é o Sono de Nosso Pai

Seja feita a vossa cama
3º Dogma: O estado natural dos corpos materiais, de acordo com a Vontade de Pai Preguiça, é o estado horizontal, em que eles poderão repousar em objetos como camas - macios, confortáveis e quentinhos.

Assim na casa como no quarto
4º Dogma: Proclamai o Legado de Nosso Pai em todos os lugares, e em todos os lugares esteja em seu estado natural.

O descanso nosso de cada dia nos dai hoje
5º Dogma: O Descanso é o anúncio das Boas Novas de Nosso Pai. Seus filhos devem levar o Descanso a todas as criaturas vivas e anunciar a Salvação que Nosso Pai oferece a todos.

Perdoai os nossos trabalhos
6º Dogma: Não pecarás contra os Dogmas de Nosso Pai praticando a maior das Atividades Imperdoáveis: o trabalho.

Assim como nós perdoamos
7º Dogma: Todos erram. Nosso Pai ordena que perdoemos aqueles que erram, pois é trabalhoso puni-los de alguma forma.

Aqueles que têm se esforçado
8º Dogma: Mesmo aqueles que praticaram a maior das Atividades Imperdoáveis podem se redimir de seu pecado, se voltarem às graças de Nosso Pai.

E não nos deixei servir a um patrão
9º Dogma: Nosso Pai tem um grande inimigo que impede a propagação de suas Boas Novas: o trabalho, também conhecido como Capiroto. O trabalho age neste mundo por meio dos seus servos, os patrões, espíritos malignos a serviço do Capiroto. Mas a crença em Nosso Pai nos protegerá desses seres abomináveis, e nos libertará do jugo e da escravidão.

Mas livrai-nos do emprego
10º Dogma: Nosso Pai proverá o sustento a todos aqueles que O honrarem e observarem todos estes Dogmas (principalmente o 9º Dogma).

Dos Princípios da Vida e Sobre como Evitar os Efeitos Deles em Nossas Vidas

Caríssimos e inestimados amigos e queridos leitores deste ligeiro informativo dos processos não-naturais e não-saudáveis que se dão em algum dos cantos acolchoados sob o teto opressivo na já tão querida e tradicional cela imanada em alguma transcendência do manicômio por todos e por nenhuma pessoa conhecido como "realidade consensual", isolado da realidade pelos ditirambos de Matrix. Enquanto este humilde cronista das coisas reais sem realidade e das verdades sem palavras permanecer pensando ele continuará existindo, de acordo com o bom e nobre amigo Renée Descartes - não que ele faça muita questão disso, mas de vez em quando estar em do lado de cá dos véus de Maya é algo interessante. E enquanto ele existe vai percebendo uma coisa muito curiosa: as coisas passam.
Isso mesmo: as coisas passam - um conhecimento extremamente trivial para todos aqueles que olham pela janela do ônibus enquanto ele se movimenta, por exemplo. Se vocês preferirem eu ponho a questão em outras palavras: as coisas se movem; as coisas mudam; nada dura para sempre; "nada como um dia depois do outro"; nada é eterno; etc. Nada aparentemente muito importante ou profundo, meus caros, mas são justamente essas coisas que inspiram as mais profundas e interessantes reflexões possíveis à mente humana (ou as piores e mais superficiais, dependendo do indivíduo que se dedica a essa atividade).
Mas a atividade de um amante da sabedoria não deve se restringir às coisas óbvias e triviais - deve-se partir delas para alçar as alturas ou as profundidades, e não usá-las como desculpa para permanecer na superfície da questão. Assim não basta a um maluco, quer dizer, um amante da sabedoria detectar essas coisas, mas ele deve refletir sobre elas. "Por que ele deve refletir sobre elas?", vocês perguntariam. Não sei responder essa pergunta, mas eu sei que ela tem a mesma resposta da pergunta "por que os pássaros voam?" - é algo maior do que todos nós, um imperativo que vem do fundo da alma e dirige todos os nossos atos, e é por isso que eu digo que Filosofia é coisa de maluco. Se me permitem uma metáfora, qualquer um que tenha escutado a Primeira Canção dos Ainur, Ainulindalë, vai viver por essa Canção, e ela o inspirará para todo o sempre - mesmo tendo Melkor feito caquinha.
Embalado pela Primeira Canção, pus-me a refletir sobre as coisas que eu via passando velozmente pela janela de um ônibus na Baixada Fluminense, Rio de Janeiro, no qual eu estava. Eu particularmente não gosto de pensar porque o Pensamento revela a Verdade e a Verdade provoca o fim das ilusões que nos agradam, mas há algo mais forte que eu que me obriga a pensar e me dita as conclusões. Percebi que há muita validade naquela canção do Lulu Santos, Como Uma Onda: "Tudo que se vê não é/Igual ao que a gente/Viu há um segundo/Tudo muda o tempo todo/No mundo". As coisas passam, um segundo não é como o que veio antes dele e não será como o que virá depois. Um segundo que passa é irrecuperável, perde-se nas brumas do Tempo, dissolve-se em menos que nada.
"Um dos princípios que rege este mundo é a efemeridade das coisas", pensei de imediato. As coisas são transitórias, não duram mais do que um simples suspiro na Longa Noite. Lojas que eu sempre quis visitar faliram antes de eu conhecê-las. Pessoas com as quais eu sempre quis puxar algum assunto não estão mais lá. O segundo que passou levou mais coisas do que eu gostaria que levasse, e deixou, em seu tempo, menos do que eu precisava dele. Passamos os segundos sempre com essa sensação de perda, de prejuízo - e nada fica para compensar esse vazio que nos resta, essa sensação de incomplitude e de estar oco que é mais terrível que o pior dos nossos medos. No fim: nada fomos, nada somos, nada seremos, pois tudo isso será levado insensivelmente pelo segundo seguinte, que não deixará nada em troca.
Essa efemeridade das coisas leva fatalmente a uma ausência total de sentido nas coisas, um vazio existencial que conduz à questão: "qual é o sentido das coisas, se tudo o que há está fadado ao oblívio eterno em mais ou menos segundo e será como se nunca tivesse estado na Memória dos homens?" E não há pensamento, intuição ou revelação que consiga resolver este quase paradoxo: no fundo, se a vida é destituída de sentido, vivemos apenas para continuar vivendo - o que é extremamente verdadeiro nos grandes centros urbanos. Para muitos é a maior das bênçãos não ser capaz de enfileirar dois pensamentos e extrair alguma conclusão lógica válida a partir deles, mas para aqueles que, como eu, foram amaldiçoados com o dom do pensamento é terrível viver sob esse peso: saber que as coisas são destituídas de sentido, de propósito, de motivo, e não poder fazer quase nada para mudar esse mundo cruel e opressivo em que vivemos subjugados a essa lei anti-natural.
Mas olhando ao meu redor vi que existe apenas duas formas de se atribuir sentido a este mundo louco em que vivemos. A primeira é para alguns falsa e ilusória: acreditar em poderes superiores que a tudo justificam simplesmente por existirem - tal como o Motor Imóvel de Aristóteles ou Deus no cristianismo. Sentir Fé, que explica as coisas relacionando-as com esses poderes superiores, é uma das melhores coisas que o homem possui, pois o impede de cair no abismo do niilismo total. Poder apelar para alguma explicação nos momentos em que se é pego sem nenhuma explicação racional possível ajuda a mente humana a não se desmantelar por completo em uma poça de paradoxos insolúveis. Como disse Dostoievski numa tentativa de formular esse paradoxo: "sem Deus, tudo é possível". Voltaire, por sua vez, formulou a saída para esse paradoxo: "Este Deus é tão maravilhoso e necessário que mesmo se ele não existisse seria necessário inventá-lo".
A outra forma é o Amor. Sem Amor o homem nada seria, conforme disse São Paulo aos Coríntios em um dos mais belos "discursos" de todos os tempos - a palavra "discurso" está entre aspas porque ele redigiu aquele texto, não o pronunciou. O Amor é de uma tal natureza que, assim como a Fé, se ampara em alguma coisa para justificar todas as demais - mas não necessariamente um poder superior. Podemos amar uma mulher ou um homem (conforme o gosto de cada um), nossas famílias, e cada um desses amores irá justificar todo o mundo que existe ao nosso redor. Percebamos que o Amor e a Fé não se excluem, mas se complementam - pois o que é a Fé senão o Amor pelos poderes superiores?
São esses os dois princípios da vida (a efemeridade e a ausência total de sentido) e as duas formas de contornar os efeitos desses princípios (o Amor e a Fé), conforme revelados a mim pelos ecos da Primeira Canção, que é a Canção do Pensamento.

Alma Russa, Alma Brasileira

Olhemos para a força da alma russa
Andando imponente com o terno puído
Comendo açúcar puro para aguentar o frio
Abrigando-se da neve no cachecol roído

Olhemos para a singeleza dessa doce alma
Que fez das estepes de gelo seu grande solar
E sente-se em casa só entre montões de neve
Sem conseguir chamar outras terras de "meu lar"

Olhemos para o amor que embala a alma
Como que a protegendo de toda sua penúria
A alma d um povo que tanto sofre ser pobre
Mas vive feliz em seu lar sem uma lamúria

Olhemos para o calor que brota lá nessa alma
Um povo de heróis simplesmente por viverem
Forjados na mais dura das escolas do homem
Prosseguem firmes em suas lutas só para vencerem

Olhemos para a pobreza mãe da alma russa
Tentemos compreender por que essa alma é
E assim entenderemos melhor a nós mesmos
Pálidas sombras loucas dançando num cabaré

Olhemos a alma russa e então olhemos a nós
Tão iguais aos russos em toda sorte de miséria
E tão fortes quanto eles para cantar meio ao caos
Nós, os filhos bastardos de alguma nação Ibéria

quinta-feira, 1 de maio de 2008

Canção à Musa

Quanta divina surpresa senti
Modelada por Hefestos em sua forja
Admirável ser de contornos sãos
E puro coração que o peito aloja

Ergue-te sobre os mortais como musa
Cantada pelos sábios bardos entre nós
Estupefatos com o renascer de Perséfone
E atônitos com o esplendor de tua voz

Mas entre os poetas escolheste um teu
E apenas a ele inspirarás o coração
Amada por ele para sempre serás
E ele, teu Dirceu, exultará de emoção

Canção para Amada

As horas caminham lentas ao teu lado
Nos poucos alegres momentos nesta vida
Sinto-me enfim inteiro em tua presença
E experimento o doce da felicidade querida

Somos um só eterno Ser nos éons do Tempo
Nascidos antes da Memória para o Amor
Circulamos como fantasmas na solidão
Até sermos re-tornados Um pelo Divino Favor

Dama, Amiga, Senhora, Princesa, Rainha
És para mim muito mais do que sei dizer
Não existem palavras para mim capazes
De cantar todos meus sentimentos por você

Oh, Amor! Aninha-te em nossas almas
Canta conosco mais esta nossa Canção
Ditada a mim pela grande Marília Musa
E escrita com palavras nascidas do Coração

Canta conosco este hino de louvor à Musa
E junta-te a mim em sublime adoração
Permite ao teu Dirceu estar contigo para sempre
Viver junto a ti conforme mandar a Emoção
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